09/03/2023 às 14h18min - Atualizada em 13/03/2023 às 00h00min

Rombos de bilhões e a história das recuperações judiciais

A sequência de recuperações judiciais, desencadeado no Brasil trouxe à tona a importância desses processos para a salvação de empresas com dificuldade

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O noticiário econômico dos últimos dias renovou um interesse antigo do público empresarial, que busca compreender o que é uma Recuperação Judicial e, principalmente, quais as consequências para a empresa devedora, seus credores e os impactos no mercado.

A Recuperação Judicial das Americanas a colocou em um peculiar grupo de empresas que confessaram dívidas bilionárias e pediram socorro ao judiciário para sanear esse passivo. Fazem parte desse grupo Odebrecht (R$ 99 Bilhões), Oi (R$ 65 Bilhões) e Samarco (R$ 51 Bilhões).

Quem vê essas cifras com zeros a perder de vista não imagina que a esmagadora maioria dos pedidos de Recuperação Judicial são realizados por empresas com dívidas bem menos pomposas.
Segundo dados do Serasa Experian de 2021, mais de 93% dos pedidos de Recuperação Judicial são de pequenas empresas. Isso se deve ao fato de que essas empresas possuem mais dificuldade em superar momentos de crise generalizada, onde o acesso ao crédito é restrito e os custos de operação normalmente disparam.

Ao analisar o histórico das pequenas empresas que pedem Recuperação Judicial, percebemos a existência de padrões que se repetem invariavelmente. O princípio da crise se apresenta com a decisão dos gestores de não realizar o pagamento de alguns tributos, afinal, o fisco é o último credor a se mover para receber seu crédito. Na sequência, percebe-se a ausência de depósitos do FGTS dos funcionários, afinal, a maior parcela dos trabalhadores não acompanha a evolução do saldo dessa conta com frequência.

Essas decisões, que numa leitura fria desse texto podem parecer irresponsáveis, demonstram a tentativa instintiva dos empresários de superar a crise, direcionando esses recursos para o caixa da empresa, que nessa altura já foi esgotado.

Sem caixa, as empresas buscam financiar sua operação junto às instituições financeiras. Se a razão da crise for mercadológica, o empresário precisa torcer para que ela passe — e rápido — pois o custo financeiro tende a comprometer ainda mais o negócio.

Mas as razões da crise nem sempre são decorrentes do mercado. A propósito, percebemos que também é recorrente que a crise se instala na empresa em razão de decisões equivocadas dos gestores, sem base empírica, ignorando os indicadores e agindo unicamente por instinto. Também é comum observar, especialmente em empresas familiares, que a recalcitrância em mudar pessoas, profissionalizar a gestão e ser fiel ao planejamento colocam o negócio nos trilhos da crise, em rota de colisão acelerada com a falência.
Independentemente do tamanho do negócio, ao identificar sinais de crise, o empresário precisa buscar aconselhamento profissional para lhe ajudar a traçar uma estratégia de superação do momento de dificuldade.

O pedido de Recuperação Judicial é uma das várias estratégias possíveis para superação da crise. É um remédio amargo, mas, se bem planejado e realizado no momento correto, pode ser uma eficiente ferramenta de gestão que proporcionará o cenário adequado para renegociação das dívidas.
Normalmente a Recuperação Judicial é dividida em quatro momentos. O primeiro deles é a fase preparatória, quando o empresário procura os profissionais da área que vão lhe assessoras com o pedido perante a justiça, elaborar o Plano de Recuperação e acompanha o processo.

O segundo momento é a apresentação do pedido perante a justiça, que poderá autorizar o processamento e determinar a suspensão das ações e execuções contra a empresa. Essa medida é extremamente útil, para que o caixa seja preservado e os recursos possam ser melhor empregados nos esforços de superação da crise.
O terceiro momento é a fase de negociações e deliberações em Assembleia Geral de Credores. É aqui que os credores vão se manifestar sobre a proposta de pagamento dos débitos da empresa. Essa fase demanda muito esforço e comprometimento de todos o time envolvido no processo, pois existem diversos interesses que precisam ser alinhados para que o Plano de Recuperação seja aprovado.

O quarto momento é o cumprimento do Plano de Recuperação aprovado pelos credores. Normalmente as empresas passam dois nos em observação judicial, isto é, os dois primeiros nos de cumprimento do Plano são fiscalizados pelo poder judiciário, através do Administrador Judicial e dos próprios credores. Após esse período a RJ já pode ser encerrada, momento em que a empresa deixa de carregar em sua razão social a expressão “em recuperação judicial”.

Os credores de empresas em Recuperação Judicial precisam estar sempre atentos ao andamento do processo, pois dentro de um processo de RJ, buscando a superação da crise, é possível, inclusive, a extinção de dívidas em determinadas circunstâncias.

A prática nos mostra que a esmagadora maioria dos credores de empresas em RJ não tomam parte no processo, deixando o destino de seus créditos à mercê da sorte, podendo amargar prejuízos totalmente evitáveis.

Quando a crise bate às portas das empresas, todo o mercado colhe as consequências. O acesso ao crédito fica mais caro em razão do aumento do risco de inadimplência, assim como a credibilidade de produtos e serviços é contestada, pois, na busca por redução de custos, as empresas em crise podem alterar seus processos produtivos para se adequar ao novo cenário.

Historicamente, o maior período com pedidos de Recuperação Judicial no Brasil ocorreu entre os anos de 2015 a 2017, principalmente em decorrência da crise das commodities, desaceleração da economia global e instabilidade política interna.

Em razão das incertezas na economia e o ambiente de alta taxa de juros, vários analistas do mercado preveem um aumento substancial dos pedidos de Recuperação Judicial no ano de 2023. Nesse cenário, planejamento e gestão precisam ser aprimorados para permitir que os efeitos da crise que se aproxima sejam superados da maneira menos traumática possível.

Ramon Santos, advogado, sócio do escritório Vera & Santos Advogados, especialista em Recuperação Judicial de Empresas

Athur Bueno é administrador, especialista em reestruturação de empresas e sócio da Ática Gestão







 
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